Arquivo para julho 2013

Vira-lata é o governo Confúcio

25/07/2013

Por Antônio Serpa do Amaral Filho

É isso mesmo: o governo Confúcio Moura está sendo chamado de vira-lata. É o que diz, com muita picardia, uma faixa exposta, nesta quarta-feira, dia 24, pelo chamado Movimento Reforma Cultural defronte ao prédio da Secretaria de Planejamento do Estado, onde ocorreu a terceira jornada de protesto e ocupação de prédio público pelos artistas.

Antes de receber os representantes do movimento, o secretário George Alessandro Gonçalves Braga exigiu a retirada da faixa, por entender ser ofensiva ao seu chefe, o governador. Os artistas retiraram os dizeres e o secretário da Seplan sentou pra conversar e receber a reivindicação da categoria: a criação de uma secretaria própria para o setor, posto que a Secel é hoje um órgão que abrange cultura, esporte e lazer. O movimento reivindica mais: quer transparência orçamentária, elaboração de políticas públicas para a cultura e projetos de parceria entre educação e cultura, reclamando ainda condições dignas de trabalho para os artistas e produtores culturais no Estado de Rondônia.

Vinícius de Moraes já dizia que o melhor amigo do homem é o uísque, o cachorro engarrafado. O melhor amigo do pobre é o vira-lata, o cachorro bem dotado, possuidor de qualidades invejadas pelo Pastor-alemão, Hottweiler e Pooodle de madame; ele é o herói sem caráter dos descamisados, favelados e desesperançados, a verdadeira raça canina tupiniquim – brasilis caninus. Vivendo na rua e tendo de matar um leão por dia, o vira-lata é um herói nacional, símbolo da tenacidade da gente brasileira, metáfora explicita de um povo que teima sobreviver no Haiti tropical. Nos seringais da Amazônia ninguém caça melhor que um vira-lata, que intimida a onça e a sucuri, denuncia o buraco de tatu, encurrala a paca e pega cutia no dente. Sem falar do macaco gogó de sola, a quem, com um simples latido, bota pra correr. Tudo isso sem treinamento e sem apelo à teoria behaviorista radical do estímulo-resposta, apenas por alegria e voluntarismo do pândego animal. Pense num cão apetrechado de predicativos!

Portanto, por esse ângulo, chamar a administração Confúcio Moura de Vira-lata é emprestar dignidade a quem, do ponto de vista cultural, não tem e atribuir qualidades a quem, do ponto de vista político, não merece. Fosse mesmo vira-lata, esse governo não padeceria de tanta falta de criatividade, de determinação e pragmatismo. Fosse mesmo vira a administração Confúcio Moura, ela se identificaria plenamente com os anseios da comunidade artística, respeitaria a cultura dos rondonienses e rondonianos, dotando suas agências de gente mais competente que a secretária Eluane Martins, colocando em prática políticas públicas em favor daqueles que produzem, nas suas várias vertentes, a arte – oxigênio mantenedor da espiritualidade criadora e da identidade de um povo.

Cachorrada mesmo é não prestigiar o nosso emergente carnaval, a Flor do Maracujá, as artes plásticas e visuais, o teatro, a música, a dança, a literatura, o cinema e tantas outras manifestações culturais que vivem à míngua como cachorro pirento, à pachorra de um governo que nem vira-lata é. Vira-lata tem tutano e talento, cara e coragem, garra e criatividade para ir à luta. Se muito for, o governo Confúcio é uma barata tonta, pegajosa e lenta, acéfala, sem brilho e sem cor, descendo de bubuia em piroga maltrapilha no rio da história.

Enquanto os cães domesticados da burocracia ladram empertigados de pudores para com seu chefe, os verdadeiros vira-latas de nobre estirpe, os produtores culturais de Porto Velho, peregrinam de porta em porta clamando por subsídios para a cultura, pedindo transparência e projetos de fomentação para o setor. Os artistas se equivocaram. O governo Confúcio não é vira-lata, é a própria lata – de lixo.

Efeito Kiss salva artistas do complexo de vira-lata

02/07/2013

Por Antônio Serpa do Amaral Filho

O Corpo de Bombeiros de Porto Velho acabou prestando relevante serviço à cultura da capital nesse último final de semana: deu parecer negativo sobre as condições de segurança no Clube Ypiranga, local onde iria acontecer, sábado, dia 29, o chamado Caldeirão Cultural, um encontro de artistas organizado pela Fundação Cultural. A idéia macabra padece de gritante incoerência. Realizam Seminário sobre a problemática cultural num dia e no outro colocam artistas de elevado nível de qualidade num péssimo espaço cênico, tido pelo povo em geral como uma pocilga infestada de pulgas e baratas. Enquanto a comunidade vai às ruas gritar por saúde, educação, cultura e segurança, aos olhos de todos e da imprensa, um segmento da comunidade artística aceita ser tratado como vira-lata, agindo de forma alienada e autômata, como se não fossem eles o espelho de onde emanam as melhores sensibilidades que cultivamos no espírito.

Se o projeto tivesse sido realizado, seria um desastre em dois sentidos: primeiro, porque representaria o aceite resignado do complexo de vira-lata que ronda o espírito da comunidade artística local e, segundo, porque, se de fato conseguisse atrair um grande público para aquele ambiente, ofereceria sérios riscos à segurança dos frequentadores. O vira-latismo é tanto que, em nível estadual, Confucio Moura nada de braçada em cima dos produtores de arte, que prometeram fazer uma Revolução Cultural e o máximo que conseguiram foi soltar dois mirrados peidos de velha no gabinete do governador, não fazendo nem cosquinha nos carapanãs que habitam o escritório do chefe do executivo estadual. Com todo respeito à tradicionalidade do Velho Leão Azul, fundado em 1919 e cinco vezes campeão de futebol em Rondônia, aquilo é uma espelunca de quinta categoria, um lugar desqualificado, desestruturado, feio e jogado às traças por falta de amor próprio também dos leoninos e da sua atual diretoria. Aquele lugar, hoje, nem de longe lembra os tempos áureos do glorioso Ypiranga de Paulo Cordeiro da Cruz Saldanha. Das glórias do passado restou, na Rua Pinheiro Machado, um cafofo mal ajambrado, decadente e com péssima imagem social, sendo o mais pobre e horrendo local do corredor de entretenimento da capital, denominado “Calçada da Fama”.

No Amazonas, quando um projeto governamental quer prestigiar e dar visibilidade a uma determinada produção cultural, os gestores mostram o espetáculo no Teatro Amazonas ou no Estúdio 5, com direito a mídia, infraestrutura de primeira qualidade e glamour. Aqui a Funcultural tira os artistas do Mercado Cultural, local que tem um mínimo de decência, e tenta apresentá-los no desbotado Ypiranga. E o pior: eles aceitam unanimemente. E como toda unanimidade é burra, no dizer de Millor Fernandes, então a burrice avassaladora acaba contaminando a todos, como uma peste da miserabilidade político-cultural. Com o incêndio naquela boate de Santa Maria/RS, ainda bem que o efeito Kiss levou nosso glorioso Corpo de Bombeiros ao local onde iria acontecer o desastre cultural e aí, sem querer, os combatentes do fogo salvaram vários artistas da vivência do complexo de vira-lata.

O prefeito Mauro Nazif, embora culturalmente medíocre, está bem assessorado com a secretária Jória Lima. Ela, sim, é que parece estar carecendo de visão crítico-histórica e de melhores quadros na sua assessoria, na Funcultural. Enquanto o Brasil acorda nas ruas, alguns dos nossos melhores artistas dormem em berço esplêndido canino, como cachorros sem dono!